quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Domingo em família...

 A música tocava no rádio. Ele cantava junto. Às vezes adiantava um pouco a entrada, mas não se incomodava, continuava a cantar. Meio desafinado, todavia, sentia-se como fosse um cantor. Foi assim durante várias músicas do Legião. Adorava Legião Urbana, lembrava  a feliz e conturbada fase da adolescência...
Logo a esposa esbravejou: Mas que merda, por que isso? Você adianta a música, inventa uns versos que não tem nada a ver!!! 
Num súbito lembrou do tempo que esteve fora de sua casa a trabalho... lá cantava o que queria pra espantar a solidão... não podia cantar muito alto, devido à vizinhança, mas ao seu tom assim agia, cantava com a alma... 
Vivia ali um antagonismo, a solidão e a liberdade, ou a companhia e a realidade policiada de privações e negociações entre harmonia e o caos??? 
Silenciou-se. Não cantou mais. A esposa irritada trocou o cantor... Mesmo assim, calou-se. A esposa incomodada com o silêncio desligou o rádio alegando que ele sentia ciúme dos cantores... 
A discussão foi inevitável... logo os nervos se exaltaram... 
Alguns minutos depois já se tinha seguido a caminhos que não eram bem relativos à discussão inicial... 
Ele pensou... por que isso? A discussão não levaria à nada... A convivência às vezes desgasta o amor. Ali não pareciam duas pessoas que se amam, e sim, dois inimigos que são obrigados a repartir um teto e buscam harmonizar suas diferenças para que o viver a dois seja possível... 
Ele engoliu a seco tudo que disse e ouviu, resolveu pedir desculpa... Ela disse que não queria desculpa. Ele a abraçou, pediu um beijo, que soou pior do que uma bofetada aos dois... O domingo já estava estragado... O rádio se silenciou... e a comida, sensível a tudo aquilo não saiu nada boa...

Marcio José de Lima 
10-07-2016


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