O dia do nada foi quando aconteceu um tudo possível. No dia do nada
foi decretado que nada seria feito. E como a música do Raul.
Ela sentou-se em sua poltrona e lá ficou tentando fazer um nada
permitido. Fechou os olhos para não ver um nada. Percebeu escuridão
sem fim e lembrou que perceber algo fugira do decreto do nada.
Sentiu uma dorzinha no rim esquerdo, pensou que teria que ir ao
médico. E o decreto do nada mais uma vez foi violado. Poderia dormir
então, mas ainda assim faria algo e não faria um nada.
Lembrou-se estupefata que se era o dia do nada, ninguém faria nada e
portanto ninguém poderia verificar se todos fariam um nada. Quem
verificaria se ela estava pensando, dormindo, caminhando, lendo?
Percebeu que no dia do nada, ela secretamente poderia fazer tudo.
Coçou seu nariz, abriu seus olhos, caminhou em seu quarto nas pontas
dos pés, perseguindo com seus olhos uma pequena aranha no teto,
brincou com os dedos das mãos, pensou na vida, pensou na morte,
cansou, pensou na luz do dia, no sol que provavelmente fazia lá
fora, com os sentidos revoltos pode sentir o aroma de café, de
flores ao vento, o cheiro do mar. No dia do nada, ela descobriu, que
nem tudo poderia fazer.
Não poderia espiar a vida lá fora, não veria o por do sol, não
poderia sentir os abraços e muito menos os beijos na face.
No dia do nada ela lembrou-se de sua solidão, de seus segredos mais
soturnos, de sua figura humana insignificante, de seus momentos
humilhantes, da sua busca por perfeição, do ser desprezível que
era... Uma mulher-nada.
Jaqueline de Andrade Borges
Legal. 😊😊
ResponderExcluirKkk tem gente que ia gostar
ResponderExcluirEu também faço vários nada :-)
ResponderExcluir