Ela estava ali imóvel.
Muito bem embalada, com o preço à altura do pescoço. Um slogan
bem atrativo em sua camiseta. A embalagem valoriza o produto. A
aparência era tudo. Estava limpinha. O perfume era bom, uma
fragrância agradável que não irritaria o cliente e quem não
passaria despercebida. O produto bom tem que ter um cheiro
agradável. Ao seu lado estava um outro produto sendo exposto, tão
bem produzido quanto ao primeiro, com todas as características de
aparência do lote, mas diferia-se pelo gênero.
Vários consumidores
passavam pela vitrine com olhares cobiçosos. Uma boa olhada nos
produtos, outra nos preços e com sorrisos decepcionados seguiam.
Todavia, permanecia em seus olhares uma indisfarçável cobiça, e
mais um sonho a ser realizado.
Como o mercado estava
aquecido não demoraria muito a serem arrematadas, essas ricas joias.
Eles certamente seriam vendidos! Mas, diferente de tudo que a loja
possuía, nesses dois espécimes havia consigo a opção – antes de
estarem ali - de aceitarem ou não serem vendidos... Estavam ali
usufruindo o resultado de uma das coisas mais belas que lhes havia
sido entregue, o livre arbítrio.
Quem desperdiçaria tal
negócio?
Produtos de primeira. Por isso não duraram mais que – para eles
quase que infinitos – quinze minutos para serem vendidos, logo após
a exposição. O negócio foi bom para o proprietário da loja. Ambos
foram vendidos pelo preço de etiqueta. Sem pechincha, sem barganha.
O comprador só não tinha visto os olhos dos dois, pois estavam
vendados.
Ao
chegar em sua casa o comprador, com toda paciência que os anos foram
responsáveis de presenteá-lo, tirou as vendas, desembalou-os e os
recepcionou com fraterno abraço. Deu-lhes alimentos, ofereceu-lhes
abrigo – caso desejassem.
Ambos
estavam a sua frente atônitos, nem imaginavam - por não terem
recebido em suas vidas - a razão de tamanho afeto. Resolveram nada
indagar. Pois no contrato de compra e venda não estavam as opções
de emitir juízo, nem indagar. O comprador falou: “paguei o preço
por vocês e a partir de hoje vocês estão livres de suas amarras...
vocês não são mais produtos, poderão emitir opinião e gozar do
prazer da contradição, além disso poderão falar, reclamar,
enxergar um mundo novo, amar, chorar e fazer tudo que desejarem... o
limite será o infinito que se aponta aos seus horizontes. Sigam seus
caminhos – se isso for de seus desígnios – sigam seus
caminhos...”.
Sem
nada mais a dizer, somente segurava um sorriso tendo sua voz presa
pela emoção, lágrimas corriam pela sua face.
Ambos
olharam fixamente o bondoso homem, sem ainda nada entender. Saíram
lentamente à rua... Olharam para a humilde casa onde residia o
comprador, a qual situava-se em uma área central e possuía um
enorme terreno. À frente da casa estava um homem recolhendo uma
placa de “vende-se”, era o homem da imobiliária.
O
casal ainda continuou a caminhar lentamente na calçada, esboçaram
um sorriso, esboçaram um entristecer e entraram sem pudores em uma
outra loja. Ofereceram-se novamente a uma nova promoção. Mas agora
tudo seria diferente, pediram para que seus olhos não fossem
vendados.
(Marcio
J. de Lima)
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