quinta-feira, 14 de outubro de 2021

O ALFABETO E O PROFESSOR


Angustiante. foi assim que eu nasci, em tempos difíceis, num sertão bravo, assim diziam os desbravadores, fui é certo rodeado pela natureza, somente uma lembrança triste, enquanto crescia. da mãe que me deu a vida e depois morreu, me deixando só neste mundão de Deus.
As roupas eram remendadas e desbotadas, pé no chão. descalço é como se diz, seis anos de idade, tinha um gatinho como amigo, os cachorros do meu pai de criação, uma cabrita, aonde eu mamava, como um cabritinho e por entre os cafezais a brincar, ora. sentava em um tronco de uma peroba caída e ficava ali olhando uma cartilha velha, que ganhei da minha mãe de criação, que já tinha sido de sua mãe, admirava aqueles rabiscos estranhos. A B C D ... E dias e dias se passavam e eu a monologava:
_Como é bonito estes traços, coloridos, meu pai disse que quando crescer. a gente vai estudar na cidade e aprender a escrever e que isto que eu vejo se chama. alfabeto, quanta vontade tenho de desvendar tudo isto. E assim eu ficava horas e horas folheando a tal cartilha.
Os meus pais eram pobres e analfabetos, e mesmo na minha inocência, sabia que era preciso. um dia estudar para vencer na vida e dar melhor condição de vida a eles.
Até que um dia, à noite. estava só, sentado numa mesa da cozinha, debaixo da luz de uma lamparina, estava ali admirando a cartilha, foi quando as letras começaram a sair do livro, a primeira foi a letra A e seguidas pelas demais e prostraram sobre a mesa e tomadas de vida, em pé, elas falavam comigo e me olhavam alegres e saltitantes, a letra A falou:
_Estenda a sua não pela mesa, assim eu fiz, e ela subiu na palma da minha mão e pediu novamente. para que eu levantasse a mão a altura do meu rosto, eu fiz, e então. na palma da minha mão, ali diante dos meus olhos a letrinha vivificada falou, mais ainda:
_A razão de estarmos aqui hoje diante de ti, é muito simples. é porque temos notado a sua admiração por nós, sentimos a sua vontade de escrever e de ler, pois então queremos ser as suas amigas para sempre, porque nunca mais nos verá assim saltitando, mas nos usará, e tenha certeza que cada vez que desenhar uma de nós saiba que estaremos ali na cartilha torcendo pela sua vitória, eu sou a letra A e comigo você ajunta a outras e poderá fazer a palavra AMOR, com o F você pode fazer a palavra FANTASIA e com a letra E você pode escrever: Esperança, e assim por diante, falava isto e as letrinhas pulavam em fila sobre a mesa e mostravam as palavras que formavam, olhava para baixo e via elas me referenciando, cumprimentavam a mim e após a letra A ter me apresentado uma a uma, então num tom sério falou, apontando para uma porta.
_Menino, por aquela porta um dia sairá e é provável que vai ter diante de si um mundo novo, perigoso e desconhecido, nós estaremos ao seu lado sempre, aprenderá a nos usar, de nós terá desfrutes, se bem usar, mas se mal nos usar, poderá muito sofrer, mas com o tempo saberá que terá além de nós, mais um guia fundamental.
Após falarem isto, alinharam-se e dando adeus, uma a uma, foram saltando para dentro da cartilha e ali permaneceram imóveis, como antes, e eu me perguntando. Como?
Como previra a letra A, por aquela porta, um dia um rapazola passou por ela, e noutro mundo foi viver, deixou para traz. a casa de barro, e os cafezais, o tronco de árvore, e a lembrança feliz, daquela noite, levou consigo apenas a velha e amiga cartilha.
Hoje, ainda olho para as letras e imagino se. poderiam elas falarem comigo de novo, poderiam me apascentar o coração, falar de alguma novidade, me encantar. trazendo a alegria e a inocência. que parece eu ter perdido, e pedir desculpas, das vezes em que as usei erradamente, mas nem a ciência evolutiva, mágicas ou qualquer outro meio me poderá fazer voltar àquele tempo.
Lembrei do outro guia, e parti em busca da descoberta, fui daqui para ali, para lá, para cá, investigando, vendo, aprendendo, observando, tomando partidos, somente agora a pouco tempo, já envelhecido, é que na esquina da ignorância. aonde homem algum não entra, ali encontrei o que queria, O PROFESSOR.
E hoje eu sou. ensino, e acompanho com paciência meus alunos, mas, ainda foi ai que no escuro da imaginação descobri um ser secreto, que as vezes o chamo de divina inspiração, um mestre dentro de mim, fundamental, aonde tudo que escrevo é digno, sem o saber dos doutos, mas com a simplicidade de um leigo, produto de um sopro constante em meu coração, a voz suave e deliciosa do mestre fundamental que sempre murmura os caminhos que devo trilhar e ele se chama Deus.


J fatimo 

 

O Blog devaneios literários do lima agradece a autorização do escritor.

Aproveitamos a data para fazer uma homenagem a todos e todas professores e professoras por esta data. Desejamos muita força, saúde  e sabedoria para esta caminhada de amor ao próximo pela dedicação a esta importante área do saber.


Para citar:

FATIMO, J. O Alfabeto e o Professor. In: Devaneios Literários do Lima, 14 out. 2021. Disponível em: https://devaneiosliterariosdolima.blogspot.com/2021/10/o-alfabeto-e-o-professor.html


Imagem:

Disponível em: https://pixabay.com/pt/vectors/blocos-de-madeira-brinquedo-25800/ Acesso em 25 out. 2021 (Pixabay License

Grátis para uso comercial Atribuição não requerida )


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