Podia ver por entre as frestas do paiol, a luz da lua cheia que clareava um pouco o ambiente escuro. Mordia a Barra do vestido numa tentativa de abafar seus gemidos de dor. Sentia suas entranhas se rasgarem...Como seria bom se pudesse voltar o tempo e blindar seu coração para o amor.Mas não foi assim... não foi. A dor vem forte dessa vez... pensa na morte horrível que terá, ali sozinha, num paiol, entre as palhas secas, numa madrugada de lua cheia... imagina que irão encontra-la ao amanhecer... que surpresa terão. Fecha os olhos e consegue ouvir ainda o som da gaita que alegrava a quermesse, os rostos alegres dos caboclos, as mulheres todas arrumadas com seus vestidos novos e assim como ela, esperavam um convite para uma dança. Num canto do salão ele a olhava com ternura, terno alinhado, sapato lustrado. Ofereceu a ela um botão de flor, estendeu seu braço em sua direção, então rodopiaram no salão a noite toda e ela aninhou-se nos olhos negros do rapaz. Depois daquele dia viam-se diariamente, após a noite cair numa clareira perto do rio...O pai da moça era grosseiro e não queria nenhum pilantra com sua menina.Ela que fosse comprometer-se com Nosso Senhor Jesus Cristo, genro melhor não teria. Então ao som das águas do rio, juraram amor eterno e consumaram o amor jurado, ele a pediu em casamento, iriam embora na noite seguinte.
Noite seguinte, beira do rio, trouxa na mão, ela esperou a quem nunca voltou. Nunca. E outras noites de espera vieram e em nenhuma ele voltou...
Meu Deus, que dor, castigo por ter pecado. Deus, misericórdia. A dor vem como um tufão, uma após a outra, eis que escuta um gritinho.
As dores cessam. Exausta, tem medo de olhar, seu coração parece sair do peito, mas precisa ver, precisa ter coragem. Levanta o pano que cobre suas pernas e em companhia da Luz da lua, fita o pequeno menino de olhos negros. Tão frágil menino, tão só em meio a suas pernas, tão seu menino. Enrola-o em trapos e segura-o no colo. O pequeno a olha com profundidade de um gigante. O sangue escorre farto e mistura-se a palha e a terra... um amortecimento bom vai tomando conta do corpo magro da nova mãe... Ela sorri para o menino, que agora está envolto em luz..Num último gesto de carinho ela beija o rosto do recém nascido e nada mais ela pôde ver. O garoto se empodera, chora alto de ensurdecer... Acorda o avô na cabana ao lado. Ao abrir a porta do paiol, o quadro é lindo mas cruel, Maria morta, sorrindo e olhar voltado para seu filho.
O avô segura aos prantos o menino no colo.
_Meu pobre Menino Jesus.
Jaqueline de Andrade Borges, Guarapuava, Paraná.
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quinta-feira, 8 de setembro de 2016
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